Museu da Ci�ncia - Universidade de Coimbra
OBJETO DO MÊS

1 a 29 de Fevereiro, 2024

PAPOILA-VERMELHA – SÍMBOLO DA PAZ, É ALIMENTO, VENENO E MEDICAMENTO

Modelo em papier-mâche da flor e do fruto da papoila-vermelha, vulgarmente conhecida por papoila-brava, papoila-das-searas, papoila-ordinária, papoila-rubra, papoila-vulgar ou papoula. Com o nº de inventário BOT.00561.1 integra a coleção de Brendel (Berlim, final século XIX) do acervo da Botânica do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra.

Remonta a 1753 a atribuição do nome científico desta espécie – Papaver rhoeas L. – descrita pelo botânico sueco Carl Linnaeus (como a letra L. indica) na sua publicação Species Plantarum (Sp. Pl.: 507, 1753).

Realçando-se o cariz didático-científico destes belíssimos “Objetos de Ciência”, as principais caraterísticas morfológicas da espécie são evidentes: planta herbácea, de caule ereto, por vezes ascendente a quase decumbente, com pêlos visíveis, embora não muito densos.

As flores escarlates são grandes, actinomórficas, solitárias e crescem sobre um pedúnculo longo; a corola é formada por quatro pétalas vistosas, suborbiculares, sobrepostas, muito finas e amarrotadas, de aspeto sedoso, normalmente de cor vermelho sangue, ocasionalmente rosa ou branco, com ou sem uma mancha escura na base. Estames filiformes e anteras azuladas.

O fruto é uma cápsula, verde-clara, subglobosa, arredondada na base, mais ou menos lisa, mais comprida do que larga, glabra. No topo possui um disco radiado (8 a 24 raios), mais largo do que a cápsula, deiscente por poros (poricida).

Papaver rhoeas L. é uma planta anual e cresce principalmente no bioma temperado, com área de distribuição natural na Macaronésia (exceto Cabo Verde), Europa até ao Mediterrâneo e Himalaia Ocidental. Ocorre em quase toda a Europa até ao Cáucaso, Centro e Oeste da Ásia, Paquistão, Japão, Norte de África e está naturalizada na América Norte. É autóctone (aparece naturalmente) em Portugal continental e Madeira e nos Açores foi introduzida pelo homem ocorrendo em todas as ilhas.

A planta pode ser encontrada em campos, pastos, baldios, pousios, montados, olivais e bermas de caminhos, com preferência por substratos algo nitrificados, associados ao pastoreio extensivo de ovinos. Tem ainda raízes delgadas e exsuda um látex branco, para cicatrização dos caules frágeis, quando quebrados.

A floração ocorre de março a julho, as duas sépalas caiem quando a flor começa a abrir, e as pétalas, muito delicadas, murcham rapidamente. Além de decorativa, a papoila tem aplicação na culinária e medicinal.

As folhas verdes e jovens, colhidas antes da floração, podem ser consumidas cruas em saladas ou cozinhadas em sopas. As pétalas, ricas em antocianidinas e com propriedades corantes, são utilizadas na preparação de tisanas e vinhos. As sementes têm sabor a noz e são utilizadas isoladamente ou com outras, como condimento em bolos e pão, sendo o óleo muito apreciado.

As primeiras referências desta planta como medicamento datam de 3400 A.C., no Egito - designavam-na a “planta da alegria”, pela capacidade de reduzir a dor e acalmar. A papoila também é reconhecida pelas suas propriedades calmantes, antitússicas, emolientes, espasmolíticas e sedativa; utilizada desde tempos antigos no tratamento de constipações, tosse, inflamações das mucosas, e como analgésico em insónia e ansiedade e tratamento de espasmos nervosos.

As plantas do género Papaver podem produzir alcalóides bioactivos e a espécie Papaver rhoeas L. contém vários alcalóides potentes, como a rhoeadina, a benzilisoquinolina e a proaporfina. As propriedades sedativas são leves comparativamente à sua congénere Papaver somniferum L., a papoila-do-ópio, da mesma família (Papaveraceae) e da qual se extraía a morfina, o ópio e outros opiáceos. No entanto, na Papaver rhoeas L. deve ser tida em conta a presença de rhoeadina, um alcaloide levemente tóxico, potencialmente perigoso, sobretudo para animais herbívoros se ingerido em grandes quantidades.

Para o homem é improvável que cause envenenamento, no entanto não é recomendada a ingestão frequente de extratos e infusões desta planta, podendo causar desconforto intestinal e de estômago. O óleo de semente também é utilizado na cosmética como benéfico para a saúde do cabelo e da pele, e tratamento de rugas.

Papaver, do latim deriva do celta “papa” ou “pappa”, comida para bebés, provavelmente associada ao facto de ter sido, no passado, combinada com outros alimentos para adormecer as crianças e as descansar. O restritivo específico rhoeas deriva do grego “rheo”, que significa escapar, pelo facto das pétalas caírem facilmente, bastando um sopro de vento, ou de “róia” – romã, pela cor vermelha das pétalas.

Papaver rhoeas L. tem um simbolismo associado à flor e ao deus do sono, Morfeu, desde a Grécia antiga - colocada nos túmulos para relembrar e honrar os mortos - sendo hoje, e para muitos, símbolo de sono eterno, de paz, e memorial dos soldados da Primeira Guerra Mundial.

 

 

Mais informações

O modelo de Papaver rhoeas L. está patente na exposição “Segredos da Luz e da Matéria” do Laboratório Chimico do Museu da Ciência da Universidade de Coimbra.


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